Era suposto eu agora escrever aqui umas quantas dicas e lições sobre fazer pão. As técnicas, os segredos, etc. Não vou fazer. Não vou fazer, porque não sei. Poucas vezes faço pão, não tenho muito tempo para isso e confesso que a motivação não é muita. Apesar das muitas dificuldades que existem em viver num meio pequeno, também há vantagens e uma delas é ainda se encontrar à venda pão com o mínimo de qualidade.
De vez em quando vem a vontade de comer um pãozinho ao jeito da minha terra, um pão de centeio de Seia. E pronto, lá vou eu fazer pão.
O pão regional de centeio, o pão da minha Serra da Estrela, não é apenas um simples pão de centeio. Ele tem uma crosta estaladiça, crocante, um sabor único, uma textura leve, tem aroma difícil de descrever. Não se estraga dum dia para o outro, basta embrulhar num pano que ele fica vários dias ótimo.
O que não posso deixar aqui de dizer são as vantagens de fazer um pão de levadura lenta.
Em primeiro lugar não devemos confundir levedura lenta com levedura natural, se bem que a levedura natural está muitas vezes associada á levedura lenta. Eu não me atrevo na levedura natural, até porque, como faço pão poucas vezes, não tenho o "isco" para fazer o pão levedar. Este pão que faço é feito com fermento químico mas numa quantidade muito reduzida.
A fermentação lenta é então um processo muito saudável de preparar pão, mesmo que feita com fermento químico, porque diminui o índice glicémico da massa durante as horas de fermentação, além de diminuir a quantidade de glúten. Isto acontece porque as leveduras vão realizar a pré-digestão do glúten. Muitas vezes a "sensibilidade" que algumas pessoas dizem ter ao glúten vem do facto de o pão que consomem ser "industrializado", logo, com fermentações aceleradas, não dando tempo para as leveduras consumirem o glúten.
Outra vantagem da fermentação lenta é que a massa fica com uma textura muito leve devido a pouca quantidade de fermento utilizado na receita. Quanto maior é a quantidade de fermento, mais pesada a massa fica e, consequentemente, a digestão é mais difícil. Isto sem falar na crosta crocante e na massa cheia de furinhos super leve….
Como vos disse em cima, raramente faço pão. Faço-o, ou porque me vem uma enorme vontade de comer pão caseiro de centeio, ou porque tenho algo especial para o acompanhar. Foi o caso deste pãozinho que hoje vos aqui mostro.
Abri um Queijo Alavão curado, um queijo já premiado, e tenho a dizer-vos que é realmente qualquer coisa digna de ser saboreada da melhor forma. Tenho de confessar que não esperava tanta qualidade dum queijo de leite de vaca. Não fui só eu a surpreendida, também os meus convidados estavam em duvida se seria mesmo um simples queijo de leite de vaca tal a textura cremosa, semi-amanteigado, o aroma suave. Pediram-me para ver o rotulo. "Ó Sandra tens a certeza que não é queijo de ovelha? Ou mistura?"
Aconselho mesmo a experimentarem. Conheço muitos queijos, são fã de queijo, é a minha grande perdição. Para uma serrana de gema como eu, o queijo de ovelha, em particular o queijo serra da estrela, é o melhor e o que mais me satisfaz. O Queijo Alavão curado consegui pôr-me a fazer pão para o saborear, como se tivesse vindo á uma semana de casa do meu pai na serra e tivesse trazido o melhor dos queijinhos regionais de lá.
Vão precisar de:
- 2 canecas (500ml no copo medidor) de farinha de centeio
- 2 canecas (500ml no copo medidor) de farinha de espelta
- 1 e 1/2 colher de chá de sal
- 0,8g (1/4 de colher de chá) de fermento de padeiro seco (qualquer marca, ex: fermipan, vahiné,..)
- 370 a 400ml de água temperatura ambiente
Acompanhou o fantástico Queijo Alavão curado, um queijo premiado, de textura semi-amanteigada, aroma suave, feito de leite de vaca nacional e um dos melhores queijos da categoria que já comi.
Confeção:
(fotos no fim)
(Nota: Planeiem o vosso pão com antecedência. Ele precisa, no mínimo, 12 horas de levedação, no entanto, quanto mais tempo deixarem levedar mais leve ele fica. Aconselho a lerem a introdução para saberem as vantagens da fermentação lenta.)
- Misturei as farinhas, sal e fermento numa tigela grande. Aos poucos fui acrescentando a água e misturando até formar uma bola de massa mole. Esta é uma massa muito pegajenta, não precisa ser batida ou sovada, apenas "hidratar" os ingredientes secos, ou seja, mistura-los em água com a ajuda duma espátula ou colher.
- Tapei a tigela com um prato e deixei descansar em lugar abrigado de correntes de ar por 15 horas (mínimo 12 e pode ir até ás 16 horas de descanso).
- Apos o tempo de descanso, a minha massa estava leve e suave, aumentou bastante de volume e ligeiramente espumosa.
- Polvilhei uma tabua de madeira com farinha e, com ajuda duma espátula, virei a massa para lá. Também com a ajuda da espátula, e porque continua a ser uma massa muito peganhenta, "dobrei-a" várias vezes. Não trabalhei muito a massa, não precisa, apenas a fui dobrando e, quando necessário, juntei mais um pouco de farinha para não agarrar á tabua.
- Coloquei uma folha de papel vegetal numa tijela e polvilhei com farinha. Passei a massa para lá e polvilhei com mais farinha. Tapei com um pano e deixei descansar mais 30 minutos. Para este descanso escolhi um lugar quente. Costumo usar a técnica do forno aquecido a 50ºC e colocar a tigela na porta aberta.
- Passado esse tempo pus o forno a aquecer a 230ºC com uma assadeira tipo pirex, bem resistente ao calor, lá dentro. (Ter o recipiente em que vamos assar o pão bem quente vai ajudar a ganhar uma crosta estaladiça, o pão fica mais leve e dura muito mais tempo).
- Quando o forno estava á temperatura certa, retirei o pirex e coloquei a massa dentro. (Eu não retire o papel vegetal para que fosse rápido; podem tirar se quiserem. Também me esqueci de fazer uma "cruz" na massa para que fique mais bonito.) Tapei com folha de alumino e levei a assar por 30 minutos. Descobri o pão, baixei para 200ºC e deixei assar por mais 25 minutos até a crosta estar dourada.
- Retirei e deixei o pão arrefecer numa gradinha. Não convém partir quente, vai estragar a textura final.
- A melhor forma de armazenar este pão é embrulhado num pano de cozinha ou toalha de chá. Em ambiente quente e húmido a degradação é mais rápida.
Tão bom ser português!
3 Comentários
Obrigada pela partilha.
ResponderEliminarDeixei a levedar durante 15 horas. Difícil parar de comer.
Será que posso retirar um pouco da massa para usar como fermento na próxima vez? Se sim tenho que usar fermento?
Obrigada
Isabel
Boa noite! Provavelmente já não vou a tempo de a esclarecer, mas com certeza haverão outras vezes a fazer esse pãozinho. Sim, pode fazer e não precisa usar qualquer fermento no próximo pão.
EliminarEu não faço isso porque não faço pão com tanta frequência, logo, não consigo usar a minha massa como "isco".
Boa noite Sandra,
EliminarObrigada pela resposta.
Na próxima vez vou deixar um pouco de massa e depois digo como ficou.
Isabel